por Paulo Cesar
Sábado, 06 de Dezembro de 2008
Essa minha história dos marinheiros, além de ter seu toque de magia e encanto que nunca mais vão se perder, antes de mais nada me remete ao âmago das minhas (novas) descobertas e vivências, a uma nova vida, um momento crítico e a reviravolta mais radical de todo o meu ser.
Fui casado, no juiz e na igreja, de véu, grinalda e festa com direito à valsa. Um casamento breve de sete anos que me deram de bom dois filhos, e também tudo que possa significar de mais ruim, desastroso, desgastante e degradante para a minha vida. Sete anos que me pareceram setenta anos, dos quais sobrevivi completamente destruído, sem mais nenhuma gota de amor pela vida e por ninguém, principalmente pelas mulheres.
Após a separação, fiquei completamente sozinho por dois anos. Minha vida se resumiu a trabalhar, voltar para casa para chorar a ausência dos meus filhos enquanto tentava me cuidar, e margar a perseguição e terrorismo diuturnos da ex-mulher que me levaram à psicologia, terapia e psiquiatria. Absolutamente nada de relações e muito menos de sexo - temia qualquer possibilidade de alguém se apossar novamente da minha vida, da minha casa e da minha alma.
Esse arrependimento do casamento (fui noivo de aliança duas vezes de duas meninas diferentes, fora outros dois ou três namoros fixos) a cada dia fazia com que meu ódio pelas mulheres aumentasse. Não julgo esse ódio, nem peço julgamentos a ninguém. Não quero ser juiz de mim mesmo, tampouco clamo por juizes. Ele simplesmente surgiu!
Detalhe: no momento da separação oficial, fui “acusado” de não ser “normal”, pois me mantive sempre fiel, apesar dos dois últimos anos de ausência total de sexo no casamento falido.
Esse preâmbulo chato e desagradável foi necessário para poder chegar ao “X” da questão: os MARINHEIROS!
Depois de um dia difícil no trabalho, atendendo telefonemas gratuitos da dita cuja berrando e me humilhando, tomei uma decisão - a vingança! Sempre fui fiel e acusado injustamente e levianamente de algo que nunca passou pela minha mente. Pois então, mesmo que fosse uma experiência só minha e só de meu conhecimento, decidi que ela seria, finalmente, traída. E não com mulher, e sim, com HOMEM! Só aceito ser acusado de “crimes” que realmente tenha cometido!
Como nessa época minha colega de sala estava de férias, ajeitei-me no seu computador estrategicamente situado (ninguém via a tela), e saí fazendo buscas de garotos de programa - na época eu nem sabia fazer isso. Só soube da existência desse tipo de profissional por conta de uma peça teatral que assisti e que depois fui conferir nos classificados de jornais. Acabei chegando numa agência com um site maravilhoso, nem parecia um site de agência. E aí parei, e fiquei por um longo mês admirando as fotos, lendo atentamente as poesias que ilustravam os perfis. Mas alguém especial me prendia a atenção, me encantava: um marinheiro! Sorriso lindo, olhos penetrantes, corpo de deus do Olimpo, pele brilhante, lisa e morena. E por incrível que pareça, era o único modelo sem nu frontal - quanto mais visitava seu perfil mais me parecia enxergar a sua alma. Para além de seu corpo escultural e perfeito estavam aquele sorriso e olhar que me instigavam e provocavam. Foi quando me dei conta que há muito me excitava com essa imagem e que ela já povoava meus sonhos há muitos dias e apimentava meu sexo solitário.
Bom, para lá de um mês depois tomei coragem, peguei o telefone idiotamente (cheio de extensões pela escola) e liguei para o tal número. Uma voz doce e amiga me atendeu, e quase desligou, porque minhas pernas moles, o tremor por todo corpo, o coração saindo pela boca e o medo me impediam de pronunciar o primeiro “alô”. Mas o alô finalmente saiu. Eu estava falando com o dono da agência, o chefe dos meninos, um rapaz também jovem. Depois descobri ser também uma grande alma!
Curiosamente se travou uma longa conversa. Sabiamente ele percebeu minha ignorância e insegurança. Profissionalmente conversou comigo, como um pai conversa com seu filho cheio de dúvidas e inseguranças. Deus sabe o que faz! Esse primeiro contato já me foi uma grande lição de vida e, depois de pouco tempo, tornamo-nos amigos e passei a freqüentar a casa dele, o que para mim se tornou uma Escola de Vida!
Mas voltemos ao MARINHEIRO! Fechei o encontro, ao peso de 200 Reais, mais táxi e motel, numa época em que eu estava falido e vivendo às custas e em casa de meus pais. Aquele marinheiro da foto me levou, portanto, a cometer a minha primeira loucura! Por amor a mim mesmo, concluo eu hoje!
Combinei de pegá-lo num shopping com meu carro. Tinha aquele rosto e aquele corpo muito nítidos na minha cabeça. Mas recomendei que ele fosse com uma roupa normal, e a de marinheiro guardada numa mochila. Nem vou falar no meu estado de espírito. Não sabia, no momento, se iria morrer ou se me mataria antes pelo inusitado da situação, para mim, naquela época.
Ele surge ao longe. Eu tentava me esconder e fingir até hoje não sei do quê nem de quem - estava longe do ponto combinado. Não o vi, portanto. Vi sim alguém parecido, conclui erradamente. Desviei o olhar, porque aquele homem era apenas parecido, nem de longe poderia ser aquele menino da foto. Com medo de fazer bobagem e provocar um desencontro, dirigi-me àquele local numa ansiedade de matar. Ao que ele se aproximou de mim e se identificou, com seu nome verdadeiro, apresentando-me seu RG!!!. Por pouco não desmaiei. Aquele menino-deus-grego da foto virtual era muito menos que aquele homem real que se me apresentou: ele era infinitamente mais belo, mais perfeitamente talhado e sua pele infinitamente mais polida. Tinha 28 anos. Mas o sorriso revelador e o olhar penetrante eram exatamente aqueles que me aprisionaram desde a primeira visita ao seu perfil virtual.
Trêmulo, levei-o até o estacionamento, coloquei-o no carro (ainda não entendia se ele era humano ou se era uma mercadoria) e parti para o motel na Raposo Tavares. Meu único pensamento: A VINGANÇA! Mas minha natureza começava a me trair, e eu me via cada vez mais excitado, mais desejoso, mais libidinoso, cheio de fantasias na cabeça, como a adolescente virgem que se entrega ao seu primeiro namorado, enquanto ele procurava quebrar o gelo, contando-me algumas coisas de sua vida. Foi quando reparei que, na realidade, seus olhos eram lindamente azuis-acinzentados, não obstante sua origem caiçara e sua pele jambo bronzeada pelo sol de Santos, onde nascera e morava.
Chegamos ao motel. Eu não sabia o que fazer com “aquilo”. Ele se viu atrapalhado no meio de toda aquela atrapalhação minha. Para desempacar, disse que ia tomar um banho e que eu ficasse tranqüilo na cama e que me acalmasse, pois que tinha uma surpresa. E depois de uns quinze ou vinte minutos surge-me na frente aquele marinheiro da foto, idêntico, igualzinho!
Comecei a suar frio. Ele aproveitou a música oportuna que tocava e iniciou um sensual strip-tease. Dançava como um bailarino clássico, perfeito, sensual, provocante. Até se transformar naquele homem completamente nu, uma estátua de Michelangelo em sua máxima perfeição de entalhes, somente com o chapéu - aquele dos oficiais da marinha! Colocou-se em pé, por sobre mim, meu quadril entre suas pernas. Eu estava gélido e petrificado como um cadáver. Não entendia onde eu estava e o que ali fazia. Conclusão: nada aconteceu de fato!
Ele se deitou ao meu lado, aquele corpão úmido colado ao meu dorso por completo. Olhou-me docemente e amorosamente, abraçou-se com calor, acariciou-me e me colocou em paz como num toque de mágica. E começou a conversar. Uma conversa emocionante como nunca mais travei na vida com ninguém. Essa conversa me apresentou, de uma forma tão simples e contundente, toda a realidade e magia do mundo gay e das relações entre homens. E também a seriedade e importância do trabalho daquele rapaz. Acho que percebeu que minha felicidade e minha vida, naquele momento, dependiam dele! Mais uma vez, repito: Deus sabe o que faz! Colocou-me no caminho a pessoa certa na hora certa. O assunto da conversa, esse continuará aqui dentro do meu coração somente, para sempre. Isso só a mim pertence - meu tesouro!
O celular dele toca. Era o cafetão dizendo que ele não deveria mais estar ali comigo, que o programa era de apenas uma hora! Ao que ele respondeu rispidamente: “ele é um cara legal e bacana. Vou continuar aqui”. E desligou.
Esse momento ficou grudado na minha alma. Passei a rezar a Deus diariamente por aquele rapaz em minhas orações, ele que mudara totalmente a minha vida em apenas algumas horas. Foi naquele momento que me entendi claramente e optei por uma nova vida!
Um mês depois ligara na mesma agência. Queria estar com ELE naquele mesmo dia e consumar o que faltava para que aquilo se tornasse uma experiência completa e definitiva. O agenciador me disse que não era possível, que a agenda dele estava cheia, tinha compromissos pessoais naquele dia e que, para ele viajar de Santos a São Paulo, eu teria que agendar com antecedência. Implorei a ele que ligasse imediatamente para o And... e que já acertasse com ele o próximo horário e dia disponíveis. Meia hora depois recebo ligação da agência. Com voz irritada o agente me disse que Ele estava naquele momento indo para a rodoviária só para me ver, e que eu o apanhasse no mesmo lugar. Dessa vez, era o MEU MARINHEIRO quem estava fazendo uma loucura! Só não sei se por amor a ele ou se por amor a mim...
Fomos para o mesmo local. Amamo-nos ardentemente, apesar da minha total falta de jeito - era a minha primeira vez: eu, a virgem donzela; ele, com o cap de marinheiro. O clima de amor foi único e indescritível. Nunca mais eu transaria com ninguém dentro de uma atmosfera de encanto e paixão parecidos. O transe de seu corpo me lembrava o movimento do mar, sua porra, a espuma das ondas quebrando na areia. Amo o mar acima de todas as coisas! E me vi beijando aquele corpo inteiro, umedecendo minha língua, vez por outra, em sua porra. Ele protesta veementemente, dizendo que aquilo era muito perigoso - ele era um estranho. Nada fez, porém, para me impedir de continuar até onde eu me sentisse completamente satisfeito de beijos e de porra... enquanto ele tinha pequenos espasmos de prazer... ele que, como michet, era proibido de gozar com clientes... E novamente aquela conversa... O agente ligou... Ele desligou, eu era “legal e bacana”... O celular começa a tocar insistentemente... Ele manda o agente à merda e desliga o celular... Ficamos ali, trocando os segredos de nossas almas, nossas vidas, nossas angústias, nossos desejos, nossas esperanças. Ele também fora casado e tinha uma filhinha da idade do meu filho. Conhecemos nossos filhos pelas fotos que ambos carregávamos em nossas carteiras. Foi uma longa e inesquecível tarde de outono.
Para ilustrar, o meu marinheiro era modelo de passarelas, coreógrafo e já fizera dois ensaios fotográficos de capa em duas revistas gays muito famosas, mas que não sobreviveram à G Magazine, como todas as outras. Procurei essas revistas desesperadamente por todo o centro de São Paulo, pois já estavam fora de circulação. Encontrei-as.
Ele pediu que o procurasse diretamente da próxima vez. Deu-me seu telefone fixo e celular. Liguei no fixo depois de uma semana, só para dizer que estava com saudades, pois dava para perceber que estava em uma espécie de escritório, cheio de pessoas ao redor, tamanho era o burburinho. Liguei outra semana em seu celular. Caixa postal, deixei um recado de saudades. Um mês depois liguei na agência, pois que queria vê-lo (não podia dizer ao seu agente - agora um bom amigo cuja casa freqüentava, que seus telefones não atendiam mais, como se não existissem). Ele não trabalhava mais lá, havia desaparecido da agência também.
Ele desapareceu de minha vida. Será que se apaixonara por mim? Não é sempre o contrário que acontece? O cliente se apaixonar inadvertidamente pela figura fantasiosa do seu michet?
Hoje vivo com esse sonho e desse sonho real que sonhei, todas as noites, todas as horas de todos os dias. Apenas enxergo marinheiros no que quer que possa representar ou significar sexo, sensualidade e prazer. Basta ver um moreno na rua de camiseta branca lisa e justa que me vejo atracado com aquele ser que simboliza o meu marinheiro. O meu marinheiro e a minha nova vida! O meu marinheiro e o meu renascimento! O marinheiro que me ensinou a amar novamente a vida, o marinheiro que me ensinou novamente a ser amado! O marinheiro lindo que me mostrou que a vida pode ser tão emocionante, bela e desejada como ele. Hoje sou outro homem!
O meu marinheiro tinha um majestoso dragão tatuado em seu ombro direito que não se revelava nas fotos, por causa de sua pele cor de jambo. Somente podia ver a nitidez daquele dragão quando estávamos juntos. Pois bem, passados alguns meses em que finalmente entendera que o havia perdido para sempre, mandei tatuar o meu dragão. Exatamente no mesmo lugar e o mais próximo possível da imagem do dragão dele que ainda guardava na minha lembrança. Com uma única diferença: a minha eu mandei colorir.
Isto tudo pode parecer um conto, mas foi real!
E que Deus guarde e guie o meu querido, amado e inesquecível Anderson por todos os dias de sua vida!
Beijo, minha vida e meu grande amor!